20.11.10


Eu gosto de falar. Acho que esse é o principal, mas não único motivo de fazer um podcast. Outro motivo seria o mesmo que me levou a fazer alguns anos de análise, às vezes me sinto completamente perdido, e escutar o que tenho a dizer faz com que tenha noção disso.
Sempre gostei de desenhar. É uma daquelas coisas que me definem. Desde criança a coisa que mais gostava de ganhar de presente era papel, a coisa seguiu pela minha adolescência, e quando tinha entre 10 e 11 anos decidi que queria fazer histórias em quadrinhos. A vida seguiu simples, e estava tão certo disso quanto que dois e dois são quatro, até que vim para São Paulo.
Se há algo que gostaria de mudar na minha história no passado foi minha mudança de cidade. Quando morava em Belém do Pará, tudo parecia tão certo, e isso se refletia no meu desenho, em minhas idéias. Não tinha receio de pensar e desenhar nada, e tinha ciência que dialogava com um mundo maior. Já havia vendido uma história quando mais criança, entre os 12 e 13 anos, depois disso me afastei dos quadrinhos de terror, que ainda eram publicados com freqüência até o inicio dos anos 90, mas minha segurança nunca me abandonou.
São Paulo mudou tudo. Não sei quando as coisas começaram a dar errado, mas de um determinado ponto, desenhar que era algo que me tirava da realidade para meu mundo particular, passou a ser cansativo e burocrático. Fosse pelas regras que se deveria seguir para desenhar para o mercado americano naquele momento, fosse pelo apego a um esboço de tradição que viciava o modo de ver do quadrinho independente, por um tempo eu perdi totalmente a noção de para quem eu desenhava.
Ninguém desenha para si. Ou se desenha para o público, ou se desenha dialogando com uma tradição. Desenhar não é apenas um plano, um desejo ou pulsão expressa, mas é um ato comunicacional. Acredito que era “feliz” quando desenhava para o público, e ainda consigo fazê-lo, mas creio que depois de conhecer a tradição é difícil não dialogar com ela. As pessoas do “meio” sempre vão te julgar em termos relativos, e isso te atinge. O publico geral não vai olhar teu desenho e pensar em quanto aquilo é diferente ou parecido com o que um Laerte faz, as pessoas simplesmente tomam aquilo pelo que é, e decidem se gostam ou não segundo as suas sensibilidades. Não há uma evocação de repertorio. É o simples gostei ou não gostei.
Talvez hoje tenha voltado a desenhar dessa forma. Afirmando um modelo de ideal estético que tenho em mente, baseado mais em gostei e não gostei do que se aquilo é comercial ou não. No entanto, o que me preocupa hoje é que cada vez mais tenho apertado o botão mental do “não gostei” em relação ao que faço. Há uma busca por algo novo, e creio que o podcast tem falado disso, de uma insatisfação. Tenho tentado dissecar a tradição dos quadrinhos, o processo criativo, o diálogo com as artes visuais. Tenho tentado entender como vejo, e como sou visto. Tudo virou uma grande oficina, e não sei onde isso vai parar. Não sei se o que falo é útil às pessoas, ou se me faço claro. Não tenho idéia de como sou interpretado, mas quando verifico o número de visitas e downloads, percebo que minhas ansiedades são as mesmas de outras pessoas que me acompanham.
O que leva a pergunta que faço a mim mesmo: afinal o que estou procurando?
Apenas quero desenhar. Quero que as pessoas gostem do eu faço. Quero ter um senso de orgulho a olhar um desenho meu, não pela admiração alheia, mas por reconhecer naquilo alguma qualidade. Na maior parte do tempo, sinto-me muito distante disso.